sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Entre "murros" da escola

Uma das atividades da interdisciplina de Escola, Cultura e Sociedade: abordagem socio-cultural e antropológica solicitava que as alunas assistissem um filme chamado "Entre os muros da Escola". Ao passar os olhos, já cansados, por cima do enunciado da atividade eu acabei lendo "Entre os murros da escola".

Li novamente, de maneira mais atenta, e percebi que havia feito a leitura errada do nome do filme. O filme conta a história de François Marin que trabalha como professor de língua francesa em uma escola de ensino médio, localizada na periferia de Paris. Ele e seus colegas de ensino buscam apoio mútuo na difícil tarefa de fazer com que os alunos aprendam algo ao longo do ano letivo. François busca estimular seus alunos, mas o descaso e a falta de educação são grandes complicadores.

Depois de assistir o filme, vi que a leitura errada que eu fiz do título do filme faz algum sentido, na medida que percebo que a escola, enquanto instituição, continua dando "murros" em ponta de faca, como diz a expressão popular que expressa quando estamos insistindo numa ação que não está dando certo.

A escola, que foi criada na Modernidade, ainda tem as suas mesmas características at'é hoje: praticamente o mesmo tipo de mobiliário, a mesma organização hierárquica, a mesma metodologia, ...

Os tempos são outros, pós-modernos, porém a escola continua a mesma de 200 aos atrás. E, obviamente, continua não dando certo. Continua dando "murros em ponta de faca". Precisamos urgentemente ultrapassar os "murros" da escola.

Formação Ética

Lendo o texto de Antonio Joaquim Severino intitulado "Formação e atuação dos professores: dos seus fundamentos éticos" refleti muito sobre a importância da ética não só no campo profissional da educação, mas também em todos os demais campos.

Lembrei de duas notícias sobre dois médicos que, a meu ver, passaram longe de agir eticamente.

O primeiro caso foi de um médico que, em um grupo de  Whatsapp, ensinava como os médicos que tratavam a ex primeira dama do Brasil, Dona Marisa Letícia deveriam proceder para matá-la.

O segundo caso foi de uma médica pediatra que negou-se a atender uma criança -por discordar do posicionamento político de sua mãe.

Fico pensando como e no que a sociedade está errando como um todo para que profissionais da saúde ajam desta forma, sem um mínimo de ética ou empatia.

É triste observar, mas a falta de ética não é uma exclusividade da área da saúde. São diversos casos que observo no meu dia a dia de falta de ética de meus colegas professores. Professores que desmerecem seus alunos, julgam-nos sem nenhum tipo de empatia, dão-lhes ou tiram-lhes nota baseados em julgamentos e não nas aprendizagens. Enfim, uma gama sistemática de ações não pautadas em valores éticos.

Me questiono: como estes professores sem ética poderão formar cidadãos éticos?

Talvez este meu questionamento seja a resposta de "onde a sociedade está errando?"

Brancos e não brancos


“Se você não tem sangue negro ou índio nas veias, deve ter nas mãos.” (Rodrigo Ciríaco)


Ao assistir o vídeo de Beatriz Nascimento sobre a história do negro no Brasil, a frase acima, que eu havia lido já faz algum tempo na internet, me veio imediatamente na cabeça. Esta história do negro, segundo destaca a historiadora, foi escrita por mãos brancas.

Ressalto, novamente, a importância do local de fala: quem fala do que.

Neste sentido, lembrei também de uma música de um artista da cena portoalegrense que eu gosto muito, Richard Serraria que fala sobre a questão do branco na mídia.

Eu, enquanto branca, senti o tapa na cara que esta música muito provocativa pretende dar. Me desacomodei porque alguém, no seu local de fala, mostrou que lugares e que espaços eu ocupo na sociedade e que outras pessoas, não brancas, não ocupam. 


Brancos
Bataclã e Mastigadores de Poesia - Richard Serraria

Brancos são aqueles tipos que aparecem nos comerciais
Ao contrário do que acontece com não-brancos
A presença de brancos em peças publicitárias
Não precisa ser justificada.
Brancos, a rigor não existem
Os comerciais é que lhes conferem existência
A máxima segundo a qual
Um produto que tem um branco como garoto propaganda
É indicativo de que este produto
Será bem recebido só se justifica
Pela preguiça, pelo cansaço e pelo preconceito.
Brancos são universais, jamais particulares
Para os brancos, qualquer um que se afirme não branco
Comete um crime de lesa humanidade
Afinal somos todos humanos
Tenho amigos brancos, são engraçados
A branquitude dos brancos é cega
Brancos dizem": você sabe com quem está falando?
É branca a mão em close up que passa ou insere o cartão de crédito
as cartilhas de lógica, consta
Sócrates é branco
Brancos não aceitam ser coadjuvantes
Pagam seus impostos e fazem questão de publicar isto
Se auto proclamam brancos, mas a contragosto
Pois isso, afirmar uma identidade ainda que provisória é coisa de não brancos

Segue abaixo o vídeo da historiadora Beatriz Nascimento:



quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

A voz aos imbecis

Faz duas semanas, eu e meu namorado pegamos um Uber. Nós dois vínhamos conversando no banco de trás do carro e eu contava a ele sobre as atividades que eu estava fazendo no PEAD.

Falei a ele do vídeo da entrevista do Leandro Karnal que eu havia assistido para uma interdisciplina, quando o motorista do Uber deu sua opinião:

- Este Karnal é um sofista, só sabe falar o óbvio de maneira rebuscada.

Não sou grande admiradora de Leandro Karnal, principalmente depois da foto dele em jantar com o juiz Sérgio Moro, mas naquele momento tive que defender o historiador. Disse para o motorista do Uber que o que Karnal fala pode ser óbvio ou não ser novidade para ele, mas que para muita gente é.

E o mais importante: sem deixar de usar termos acadêmicos, ele traz à popularidade assuntos muito importantes.

Como o desta entrevista:


O que mais me chamou a atenção foi o comentário de Karnal em relação à frase de Umberto Eco "A internet deu voz aos imbecis.".

Neste aspecto, concordo com o historiador que diz que a popularização das informações é boa e é ruim, na medida que notícias falsas ou até mesmo textos e vídeos impregnados de ódios e preconceitos circulam livremente pela internet em pé de igualdade de acesso com textos dos mais renomados autores.

Eis o perigo na era da informação

O Ato de Estudar

Este ano eu dei aula de História e Geografia para o Ensino Médio. Confesso que este nível de ensino não é o meu favorito, mas este é assunto para uma outra eventual postagem. Pretendo, aqui, analisar um pouco como foi esta experiência de docência com os alunos "grandes".

Ao ler o texto "O Ato de Estudar" de Leda Miranda Hühne, lembrei na mesma hora dos meus alunos do Ensino Médio e o quanto era custoso para mim convencê-los de estudar, seja para um seminário em sala de aula ou até mesmo para as provas. E isso que o "estudo" que eu solicitava a eles era uma mera leitura ou preparação para uma atividade (avaliativa ou não).

Porém, depois da leitura do texto, fiquei pensando que se os alunos não faziam o mínimo que eu solicitava, imagina se eu fosse solicitar que eles estudassem MESMO, de maneira a construir o conhecimento como a autora fala em seu texto. Leda Miranda Hühne, citando Paulo Freire, lista os itens indispensáveis ao ato de estudar. São eles:

  • O estudante deve assumir um papel de sujeito o ato de estudar.
  • O ato de estudar é uma atitude frente ao mudo.
  • O estudo de um tema específico deve colocar o estudioso a par da bibliografia em questão.
  • O ato de estudar depende de um atitude de humildade face ao saber.
  • O ato de estudar significa compreender e criticar.
  • Estudar significa assumir "uma misteriosa relação dialógica" com o autor do texto, cujo mediador é o tema!
  • O ato de estudar, como reflexão crítica, exige do sujeito uma reflexão sobre o próprio significado de estudar.
Sinceramente não sei nem por onde começar para tentar fazer o meu aluno compreender como se estuda, como deve-se encarar o conhecimento.

E, novamente, sigo em defesa de minha classe: NÃO JOGUEM TODA A RESPONSABILIDADE SOBRE O PROFESSOR!!!

Não me coloquem numa sala de aula quente, com 30 adolescentes munida apenas de um quadro e livros didáticos de qualidade duvidosa achando que eu vou mudar o mundo, porque isso, desta maneira, é impossível.

Pensemos no sistema, antes de culpabilizar o professor.

Os locais de fala

Certa vez eu conversava com um amigo, branco como eu, sobre racismo. Tentava convencer meu amigo o quanto nós, pessoas brancas, gozamos de privilégios que as pessoas não brancas não têm.

Meu amigo disse que discordava do termo "privilégio", termo este utilizado amplamente pelos movimentos negros para nomear as benesses que pessoas brancas têm e que as não brancas não têm.

Falei para meu amigo que eu concordava com o termo e que não achava que nós dois (duas pessoas brancas) estávamos em condição de julgar o termo como certo ou errado pois nunca vivenciamos situações de racismo. Sabemos delas pelo que nos é relatado e por mais sensíveis que sejamos, jamais saberemos como é realmente passar por esta situação.

Meu amigo ainda continuou discordando de mim, e discorda até hoje. Encerramos o assunto por ali porque percebemos que nenhum dos dois mudaria de opinião.

Para mim a grande questão é o local de fala. Ou melhor, a importância do local de fala.

Enquanto mulher, não dou direito a nenhum homem dizer o que é ou não uma situação de machismo. Este é o meu local de fala, aquele que não passa pelo que eu passo não tem, a meu ver, direito de opinião, por mais empatia que demonstre ter.

Deixo abaixo dois vídeos muito interessantes que falam um pouco sobre isso: o local da fala. Na medida em que nos vídeos há uma tentativa de troca de papéis, um olhar sensível consegue perceber que só pode falar de racismo ou de inclusão (temas dos vídeos) quem realmente passa por isso.






Preconceito: social ou individual



A Wikipédia define o termo preconceito como:

"um juízo preconcebido, manifestado geralmente na forma de uma atitude discriminatória perante pessoas, culturas, religiões, lugares ou tradições considerados diferentes ou "estranhos". Ao ser usado no sentido pejorativo costuma ser simplista, grosseiro e maniqueísta. As formas mais comuns de preconceito são: social, racial, cultural e sexual."
 
Qualquer um que foge do que é socialmente aceito é considerado diferente, logo acaba sendo alvo de algum tipo de preconceito. A sociedade impõe um modelo do que é "aceitável" e se, por algum motivo, você não se enquadra neste modelo, pode vir a ser vítima de preconceito.

Neste sentido, podemos considerar o preconceito como sendo de causa social, ou seja, é o meio social que estabelece os padrões de certo/errado, bom/mau, bonito/feio, aceitável/não aceitável. Ninguém nasce imbuído deste tipo de padrão, é a sociedade que que dita essas “regras”.

Já é famosa esta frase que circula pela internet:

 
Portanto, podemos concluir que o preconceito nos é ensinado.

Porém o preconceito é exercido de maneira individual, na medida que é cada sujeito que manifesta ou não o seu preconceito nas suas ações cotidianas, nas suas escolhas e até mesmo de maneiras agressivas ou violentas.

Assim podemos dizer que o preconceito é individual (exercido individualmente) e social (criado pela sociedade).

Entendendo melhor o cerne do preconceito, podemos repensar de que maneira trabalhar em sala de aula.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

O pensamento crítico X dogmático

Pensamento Crítico

    Nós temos dois modos de sustentar nossas opiniões e concepções: o dogmático e o crítico. No primeiro modo eu afirmo algo sem me preocupar em justificar aquilo que afirmo. Já o pensamento crítico é aquele que justifica, através de argumentos e evidências, aquilo que está afirmando. O pensamento crítico permite o diálogo, na medida em que estabelece regras comuns para justificar o que é dito. O pensamento dogmático só permite o monólogo.

     Retirei este parágrafo da página do moodle da interdisciplina de Filosofia da Educação, este é o link da mesma. Em tempos de debates acirrados nas redes sociais em que as pessoas simplesmente despejam falsas notícias, ofensas e agressões sobre a justificativa de "é a minha opinião", acredito que a reflexão sobre a forma de sustentar nossas opiniões se faz muito necessária.

      Utilizo bastante as redes sociais, principalmente o Facebook e o que observo atualmente é a sustentação dogmática de opiniões, muitas vezes carregadas de ódios e preconceitos sob a justificativa do "é minha opinião e você deve aceitar" ou ainda "você deve respeitar a minha liberdade de expressão". 
  
       Esta forma de sustentação de opinião não permite o debate e até mesmo um simples diálogo. 

      Em tempos de "fake news" (notícias falsas publicadas intencionalmente) e difundidas em larga escala, uma sustentação de opinião que não possibilita o diálogo é, no mínimo, perigosa. Ainda mais em diante do momento político em que vivemos, de tensionamentos e ódios extremos.

       Acredito que todo tipo de opinião deva ser embasada no conhecimento prévio do assunto a ser tratado a aberta à dialogicidade. Ninguém é dono da  verdade absoluta, ninguém é dotado do saber pleno sobre tudo. Nada garante que o que é verdade hoje venha a ser amanhã também.

       A opinião é sempre bem vinda, desde que baseada no conhecimento e aberta ao diálogo.

Escola Moderna na realidade Pós Moderna




Em uma escola em São Paulo um aluno agrediu um professor com um soco no rosto. Houve até uma filmagem da agressão, em que um estudante de 20 anos do terceiro ano do Ensino Médio discute com o professor e lhe desfere um golpe no rosto. Este caso de agressão foi amplamente noticiado pela mídia.
Tentarei aqui não cair no discurso de senso comum de que “antigamente havia mais respeito com o professor” ou “dever de educar é da família, a escola deve apenas ensinar.” Acredito que uma explicação para um fato desses vá além destas respostas simples.
Acredito que casos extremos como este, de agressão de professores, são fruto do que é discutido no texto de Luciani Missio e Jorge Luiz da Cunha, ou seja, a escola enquanto instituição moderna diante de uma realidade pós-moderna.
É fato que desde sua criação na Modernidade a escola pouco mudou. Desde sua estrutura física (salas de aula, disposição do mobiliário, ...), sua organização hierárquica (professores, diretores, coordenadores, ...) e até mesmo sua metodologia (aulas expositivas, uso do quadro negro, cópia e reprodução, uso de cadernos, ...).
  A escola é a mesma, porém os alunos não são os mesmos que há cem anos atrás. Vivemos a era da informação e dos questionamentos. E a escola parece não ter se adaptado a esta nova era.
A resposta vem de várias maneiras: na falta de interesse dos alunos, na desvalorização do professor e, algumas vezes, na violência e agressividade dos alunos com seus professores. Infelizmente o professor é a “bucha de canhão” de todo este processo.


terça-feira, 16 de janeiro de 2018

O método clínico de Piaget

Piaget, ao desenvolver seu Método Clínico, partiu de uma premissa muito interessante: a de que o importante não é se a resposta dada pela criança está certa ou errada, mas sim a observância da maneira como a criança fez para chegar a esta resposta. Que hipóteses lançou, de que maneira organizou seu pensamento, etc.

A partir desta análise sutil, podemos perceber em que estágio de desenvolvimento ela se encontra.

Realizei a atividade de aplicação do teste piagetiano com o vizinho da minha mãe, chamado Lucas. Um menino muito simpático, que adora ir na casa da minha mãe brincar com a Candinha (a gatinha da minha mãe).

Nosso teste foi assim:

Relatório de aplicação de Método Clínico Piagetiano

Aplicador: Núbia Cerutti
Criança testada: Lucas
Idade: 11 aos

Foi apresentado por mim a Lucas duas massinhas de modelar, uma azul e outra amarela, no formato em que estavam na caixa (em forma de “salsicha”) dispostas lado a lado.

Núbia: - Então, Lucas, o que tu tem a dizer sobre estas massinhas?
Lucas: - Hum... Elas são meio que durinhas, mas quando a gente pega elas são maleáveis. Eu acho que dá pra fazer qualquer coisa com elas.
Núbia: E qual dessas massinhas é maior?
Lucas: - As duas têm o mesmo tamanho.
Núbia: - E se eu fizer assim?
(peguei a massinha amarela, fiz uma “bolinha” e coloquei ao lado da massinha azul)
Núbia: - Agora qual que é a maior?
Lucas: - Daí agora eu fiquei com uma dúvida: eu to querendo saber se tu tá querendo saber se é maior assim ou assim?
(Lucas aponta para o comprimento da massinha em forma de “salsicha” e para a altura da massinha em forma de “bolinha”)
Núbia: - Onde tem mais massinha?
Lucas: - Hum... Onde tem mais massa? Agora eu acho que é essa.
(Lucas aponta para a massinha amarela em forma de bolinha)
Núbia: - Tá, e se eu fizer assim?
(fiz a massinha amarela em forma de “salsicha” novamente e a massinha azul em forma de “bolinh”)
Núbia: – Qual que é maior agora?
Lucas: - Eu acho que é essa.
(Lucas aponta para a massinha azul em forma de “bolinha”)
Núbia: - Então tá bom, muito obrigada

O que percebi é que fiquei muito ansiosa ao aplicar o teste. Queria logo saber as respostas de Lucas para analisá-las o mais rápido possível. Isso empobreceu o meu teste, pois não questionei Lucas sobre o porquê de suas respostas, e isso dificultou bastante a interpretação do teste.